21.12.06

Há informação de 'serviço público'?

Sandra Sá Couto, jornalista da RTP-Porto, defendeu na Universidade do Porto a sua tese de Mestrado sobre as últimas eleições presidenciais. Intitulada "Televisão, campanha eleitoral e pluralismo" a tese analisa os três telejornais generalistas e conclui que foi dada mais atenção a assuntos de estratégia do que aos temas políticos propriamente ditos e considera que "não houve grande diferença entre a cobertura do serviço público e a dos canais privados". (Ver também Candidatos sem voz nos directos da TV, DN, 22.12.06).

À partida, a informação, toda ela – dos meios de comunicação social do Estado e dos operadores privados – deveria ser, por assim dizer, de ‘serviço público’, em acordo com a ética e a responsabilidade social que se exige aos media, respeitando o interesse geral, respeitando o superior interesse da sociedade portuguesa no seu conjunto e da Cidadania.

Mas sabemos que não é assim. A informação tablóide e sensacionalista já leva mais de um século e invadiu também as televisões. Hoje há um termo mais suave que caracteriza essa contaminação da boa ‘moeda’ jornalística pela ‘má’: a contaminação do rigor da informação pelo espectáculo das notícias. É o termo 'infotainment', como é sabido.


É evidente que o Serviço Público de Televisão existe também para fazer cumprir o princípio ético e de cidadania que os privados têm dificuldade em seguir, dado que mais facilmente escorregam para a discriminação ‘audimétrica’ do acontecimento, para a submissão à ditadura da audiência, sobretudo quando se trata de reportar a pequena política e o ‘sound-byte’, a catástrofe e o fait-divers, o ‘infotainment’, o futebol, o sequestro em directo, etc., etc. A questão e saber se a televisão pública 'mimetiza' também aqui as privadas. E na tese de Sandra Sá Couto parece haver aí uma aproximação entre as práticas pública e privadas.


Deveria haver, de facto, uma distinção entre a informação de um Serviço Público de Televisão, que tem objectivos mais estritos de interesse público, e a informação da concorrência privada. Quanto mais não fosse, pela necessidade de aprofundamento informativo das realidades críticas, nomeadamente nas áreas centrais para o desenvolvimento do país: desde logo Educação, Educação, Educação (sobretudo pré-primário e primário, mas também secundário e superior), Experiência Social, Cidadania, etc.


E pela necessidade de aprofundamento informativo das realidades dinâmicas do país, da Ciência e Cultura à Economia e também nas áreas da Inovação, das tecnologias e em tudo o que reporte uma afirmação de Portugal e dos portugueses no país e no Mundo.

No plano da informação, o que é suposto que o Serviço Público ‘inscreva’: a insubmissão editorial face às agências de comunicação e de relações públicas, aos ‘spin doctors’ e aos jornalistas ‘hipotecados’ nos gabinetes ministeriais, ao sensacionalismo e ao pseudo-acontecimento, à agenda do futebol, à actualidade trágica e à catástrofe. O pluralismo e a independência, na informação, no debate e no comentário político. E que a Cultura, a Educação e a Literacia Digital deixem de ter uma expressão insignificante na informação.

No plano da programação também (sem que esta acabe por submeter a informação a 'tempos' de emissão dependentes de outras estratégias), pela introdução da diferença e da qualidade na programação, respeitando a Lei em matéria de programação de qualidade, de programação diversificada (atendendo prioritariamente aos públicos mais sensíveis – crianças e jovens), que eleve em geral para formação cultural e cívica dos telespectadores e nessa medida contribua para um novo sistema de media, designadamente na televisão generalista, independente e claramente ao serviço dos cidadãos.

Um sistema que integre inequivocamente a virtude civil, e a experiência social e de cidadania. Que integre as boas práticas culturais, empresariais, tecnológicas, científicas, etc. Um sistema que se paute pela ética e pela responsabilidade social. Um sistema que discrimine o acontecimento, mas em função de um modelo social justo e solidário, por muito que isso possa colidir com estratégias de governação e interesses conjunturais politico-partidários.

Papel do Estado? Claro! Recuperar o tempo perdido e o laxismo dos últimos 15 anos em matéria de Televisão e reforçar, naturalmente, a regulação dos Media face ao Interesse Público. Uma regulação, no caso português, com uma atenção muito particular à Televisão, sendo certo que a displicência do audiovisual relativamente aos temas da SI é uma grave negligência no plano da sua responsabilidade social. Uma regulação que contribua para o reforço e emancipação da Opinião Pública em Portugal. Uma monitorização apertada dos operadores público e privados face às suas responsabilidades legais em defesa, nomeadamente da Identidade Cultural portuguesa e do Interesse Público nacional.

E não é pouco...

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