28.2.07

RTP, 50 anos: balanço geral negativo

(Depoimento a Francisca Cunha Rêgo, Jornal de Letras, 28/2)

Qual o balanço que faz dos 50 anos da RTP?

O balanço geral é negativo. Isto porque a pergunta que eu me faço é a de saber se – e como – a RTP contribuiu para o engrandecimento do país, se, ao longo dos seus 50 anos, ajudou à formação de uma opinião pública esclarecida, participativa, emancipada, se, de um modo geral, teve (tem) uma visão desassombrada e distanciada da política e dos políticos que a têm (e nos têm) governado, se soube integrar a identidade cultural portuguesa, a experiência social, a virtude civil, etc. E a resposta é, claramente, não. Pior que isso, aparenta não estar interessada nisso. Este, genericamente, é o aspecto mais negativo da história da RTP.

Momentos fortemente positivos ao longo dos 50 anos da RTP, isto é, aqueles em que se cruzou com o sentido da História e soube agarrar a oportunidade, por assim dizer, não são muitos. Aquele que me parece o mais emblemático desse feliz encontro é precisamente o Zip-Zip, de Solnado, Carlos Cruz, Fialho Gouveia e Thilo Krassman, em 1969. Nunca como então a virtude cívica, o desassombro cultural e o risco político terão ido tão longe na RTP, apesar da ditadura. Desse tempo temos que ressalvar ainda nomes como Nemésio, António Pedro, David Mourão-Ferreira, que afrontaram o pequeno écrã, com a força da inteligência, que agora, inversamente, dramaticamente, se pratica.

Histórica, ainda, foi a era documental, de autêntico “newsreal” do pós-25 de Abril, com o empenho das cooperativas de cinema e de quase todos os cineastas portugueses. E o mítico Informação/2, da RTP2 de Fernando Lopes, depois silenciado por Proença de Carvalho.

Como vê hoje a RTP?

Continuo a sentir uma grande tristeza por ver que o serviço público de televisão não sabe, ou não quer, contribuir para reflectir o país no pequeno ecrã, quer no que temos de grandioso (a começar pela História e a continuar nos actores de modernidade), quer no que temos de crítico (a começar pelo sistema de ensino e pela iliteracia). Hoje, como afinal no passado, acho que a RTP, começando naturalmente pela RTP1, não respeita nem legitima, com a sua programação e a sua informação, o financiamento público que os governos (ou melhor, os portugueses) todos os anos lhe concedem.

Quais os desafios do serviço público de televisão?

O maior desafio para a RTP é, fundamentalmente, emendar os erros do passado (e do presente). É reencontrar-se com o que no passado fez de melhor. No fundo, reencontrar o desassombro e a inteligência de fazer televisão.

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