Entrevista a Barata-Feyo: "Jornalismo: da moda ao negócio"
José Manuel Barata-Feyo é um dos jornalistas da RTP que viu trabalhos seus censurados no pós-25 de Abril. Voltaremos ao tema, mas para já vejam-se alguns extractos de uma entrevista a João Ruivo [Ensino Magazine, Nº23, Janeiro 2000]:
(...)
P: E ao nível da RTP?, Barata-Feyo está ligado há televisão pública desde 1978, sentiu pressões ao longo de todos estes anos?
R: Sempre houve pressões. É claro que as pressões de hoje são muito diferentes das efectuadas quando eu comecei a trabalhar. São menos primárias. Em 1978, quando eu era correspondente em Paris, as pressões eram tão primárias, como primária era a democracia no nosso País. Havia políticos que entendiam que deveriam ter um controlo absoluto de tudo o que era dito, e que lhes bastaria apropriarem-se de todo o aparelho que estava estatizado na altura (televisão, rádios e jornais) para manterem esse mesmo poder. Ou seja sabiam pouco de ciências políticas, embora ainda hoje não saibam muito, e partiam do princípio algo obtuso, na lógica se eu aparecer muitas vezes na televisão, os portugueses vão ouvir aquilo que eu digo, ficam convencidos e votam em mim. Só que sucessivas eleições provaram, que tendo todos eles caído nessa tentação totalitária de utilizarem os órgãos de comunicação estatizados da altura, nenhum conseguiu manter o poder e ganhar as eleições seguintes, por causa disso.
P: Mas que tipo de pressões primárias eram essas?
R: Os meios de pressão eram mais brutais. Atacava-se o jornalista no plano pessoal, as perseguições eram de ordem política. Com o professor Cavaco Silva esse tipo de pressões mudou. E hoje não se fazem, como se fizeram até meados de 1980, isto é por processos disciplinares aos jornalistas por delito de opinião. Aquilo que se verifica é uma pressão mais subtil, mais sofisticada, mais moderna e europeia, que se traduz numa constante e permanente ameaça ou promessa de reestruturação da empresa, onde os bem comportados são contemplados com outras benesses e os mal comportados (aqueles que continuam a ter uma posição de independência) são penalizados.
P: Ou seja, a chamada reestruturação da empresa é hoje o principal instrumento de pressão para com os jornalistas...
R: É, continua a ser o instrumento através do qual a tutela exerce a sua pressão. Infelizmente digo a tutela, pois continuamos a ser o único país da Europa que tem uma televisão de serviço público com estatuto governamental, em vez de um estatuto parlamentar ou social. Isto é, em vez de ter uma administração nomeada por um conselho representativo das forças vivas do País. Nós estamos num modelo primário. As administrações são nomeadas pela tutela que detém sobre elas plenos poderes, de vida e de morte. A mesma assinatura que nomeia um presidente da televisão, é a mesma assinatura que lhe retira os poderes. E nós já tivemos presidentes do Conselho de Administração que estiveram lá três meses.
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